11.7.04

New Tróia City
ou: Homero se vira no túmulo

Só pra tirar uma dúvida: este post é mais velho que o post anterior, do meu retorno, mas pra ninguém ficar sem ter o que ler, achei melhor colocá-lo on-line. Reclamações? Procure o bispo mais próximo de sua residência.

 

Sábado, 12 de julho, pleno dia dos namorados, eu carrego a minha bem-amada para dar uma saidinha. Sem muito dinheiro no bolso, optamos por uma paquerada embalada por algumas xícaras de cappucino (para mim) e água com gás (para ela). E depois fomos assistir Tróia. Cês sabem. A nova superprodução hollywoodiana cheia de medalhões chama-mulher, como Brad Pitt.

Só que a meu ver, me desculpem e me perdoem, o filme é uma porcaria de marca maior. Em vez de um épico hollywoodiano, como Gladiador, o resultado é muito menos épico e muito mais hollywoodiano.

Tá, tá certo, não é uma porcaria de marca maior. Mas poderia ser um épico à Gladiador (mesmo com Roma parecendo Nova Iorque).

Antes de mais nada: desde quando Helena de Tróia é loura?! Que eu saiba, só daí a vários séculos que os germânicos iam ter a mais vaga idéia de que existia a Grécia, que dirá misturar seu sangue a eles. E, emuito embora os figurantes até sejam bem moreninhos, como convém a um povo do mar, de pescadores, comerciantes, pastores e demais atividades rurais, com é que os personagens princiapis vão ter aquela cara de anglo-saxões?!? O Eric Bana até que não ficou mau de Heitor, com aquela cara meio latinóide e a tez amorenada.

Como diria René: "Riculo!

Como colocou o Java (conhecido pelo vulgo de Henrique), a luta de lanças entre Heitor e Aquiles é da molésta, as cenas de batalhas gerais não chegam a tanto, muito embora as (rápidas) lutas de Aquiles sejam interessantes. Outra baboseira cata-piolho é aquele absurdo de Aquiles decapitando a estátua de Apolo com um golpe de sua espada de BRONZE! Sim, porque a estátua, se fosse de pedra, madeira ou qualquer outra coisa diferente de isopor teria suportado aquele corte numa boa. Certo, certo, provavelmente Aquiles foi a primeira encarnação de Myamoto Musashi.

E a tal da Breseida, que se eu bem recordo minha Ilíada, não é parente da família real troiana nem aqui nem no inferno. Entrou ali no bolo só pra deixar Aquiles como o galã da história. E o que SATANÁS aconteceu com a presença divina? Hollywood sanitizou o troço de uma maneira tal, que até a pobre da Cassandra, uma personagem principal (e importante) do texto, é retirada pra não ter o embaraço de ter que contar uma história que não seja "realista". E nesse negócio todo, acabaram colocando o pobre do Ulisses de escanteio, ficando o espertíssimo herói da Odisséia reduzido à categoria degradante de auxiliar de coadjuvante.

Realista? Pelo meu santo daime, A Ilíada é um texto mítico, tem tanta história ali quanto no papo do Bush de ir para o Iraque "procurar armas químicas". Tróia Existiu? COm certeza. Mas as coisa não foram exatamente como na Ilíada - ali o papo é lirismo, não história.

O pior é o encaminhamento subliminar da coisa toda: uma orgulhosa e benevolente cidade-estado sendo atacada em seu orgulho por acudir uma exilada (ei, desde quando Helena seduziu Páris e QUIS fugir para Tróia? Ela não tinha sido sequestrada?) pelos bárbaros gregos com ímpetos imperialistas de anexar os pobres troianos. Troquem a espada de aquiles por um 747 e a estátua de Apolo pelo World Trade Center e vocês vão começar a ter uma idéia aproximada da coisa toda.

Mas teve uns momentos interessantes. No afã de tornar mais "realista" a narrativa, ficou bem resolvida a morte de Aquiles. No mito grego, o herói brutamontes só poderia ser ferido no calcanhar, por onde sua mãe o segurou ao banhá-lo no rio de onde ele ganhou sua suposta invulnerabilidade. E é exatamente onde ele leva a primeira flechada de Páris (que, segundo a tradição persa já embutida na Grécia, é um excelente arqueiro. Aliás, talvez ele deva algo por ter sido elfo, mas aí já é outro filme) no calcanhar, para que sua mobilidade seja reduzida, dando tempo ao arqueiro para um novo disparo mais certeiro e mais outro, e outro... O herói arranca as flechas e deixa apenas a do calcanhar, antes de morrer - as mais incômodas. Assim fica, para quem o encontrou, que ele só foi morto pela flecha no calcanhar, seu único ponto fraco.

Falando de uma maneira geral: foi divertido, mas poderia ter sido melhor. Se a direção e produção não estivessem tão preocupados em colocar mocinhos e bandidos no filme (Menelau e Agamenon têm uma índole digna de generais americanos no Vietnã), e se preocupassem mais em contar a história de uma guerra de 5 anos ao invés de uma que durou menos de um mês, eu teria ido assistir uma duas ou três sessões.

É meio como Matriz Reloaded e Revolutions: pode ser que não cheguem nem aos pés do original, mas eu paguei com gosto para a segunda sessão de cada.

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