7.6.04

Sobre homens e mouses

Ontem eu fui bater no blog do dudu, o Dulldu, a convite de nossa querida-em-comum Denise (embora, obviamente, ela seja mais querida do Eduardo, claro), e dei com aquele texto madrugador de obviedade lógica-sem-sentido que só nerd entende e - feliz ou infelizmente - só nerd pode apreciar.

Sim, porque ser nerd é uma coisa engraçada - e eu realmente preciso deixar de usar esse "engraçado", porque senão ele vai acabar ficando como o "basicamente" do Misael: um clichê gasto, que a gente até se assusta, quando ele não pronuncia um a cada três palavras.

Mas como eu dizia - ser nerd é como ser Newton na boca de Virgílio, mas trocando Newton por Will Eisner e Virgílio por Quentin Tarantino. A gente vive num mundo de absoluta abstração. Onde as coisas, as idéias e a realidade se misturam em um caldo de conceitos e concretudes pior do que caldo da caridade com muita farinha. Tem conteúdo, claro, E tem forma, com certeza, mas tudo mesclado com um senso pessoal de ridículo e de que o acadêmico é válido apenas enquanto é funcional.

Ficou claro? Não? Então me desculpe, mas você não é nerd, nem namorado(a) de nerd. Está perdendo seu tempo e gastando minha preciosa largura de banda. Xô. Vá comer acesso de um outro blog. O do Sérgio Mallandro, por exemplo. Ou do Ratinho, sei lá.

A gente é assim mesmo - divide a humanidade entre homens e deuses, e adivinha em que pedestal a gente fica? Não é que não entendamos o papel do mito industrial em nossas vidas, ou sua relevância de motivador dos nossos despertos sonhos febris, mas é tão difícil encontrar uma parceria de pessoas sem rumo certo como nós, que quando o fazemos, agarramos como a proverbial bóia de salvação, como se nossas vidas fossem uma eterna deriva em mar revolto, apreciando cada onda leviatã com gritos de "mais uma!"

É por isso que nerd é pegajoso, insuportável, asqueroso, genioso e adorável (nossas namorada, esposas e amigadas que o digam - vão arrumar um melhor, vão!).

Quem mais vai elaborar aquelas metáforas profundas sobre a realidade repletas de humor de botequim? Quem vai integrar novela das oito com a crise do petróleo em uma piada que só quem tem PHD em economia transnacional vai entender?

we few
we brave few
we band of brothers

Como se gritássemos, acordando das profundezas de um sonhos, incertos se aquele retângulo branco e luminoso piscando insistentemente à nossa frente é apenas o cursor do sistema operacional em modo de comando ou a porta das percepções se abrindo a olhos vistos, como William Blake renascido em plena era da informação.

Nós somos assim.

Oh, I could be
prisioner in a nutshell
and count myself
as emperor of
an infinite space,
were not for my dreams.

(como se despertássemos e o mundo estivesse no seu fim, acabando em fogo ou gelo ou goiabada - o que fosse mais irônico ou mortal: meu voto vai pra goiabada)

Vidas randômicas

É engraçado (eu tenho que me livrar deste termo - vai acabar ficando igual ao "basicamente" do Misael) como as coisas - e as pessoas em minha vida chegam de maneira tão inesperada e tão óbvia.

Com isso eu quero dizer que as pessoas à minha volta, aquelas que estão próximas, aquelas distantes apenas pela espaço entre nós, e aquelas cujos caminhos não cruzam mais os meus, e que me deixam imaginando quando irão fazê-lo.

Embora eu pareça um tanto triste neste início de texto, não me entendam mal (e eu já posso ouvir Elvis Costello solfejando oh, God, please, don´t let me be misunderstood), não confundam nostalgia com melancolia - são dois estados de espírito bem diferentes. Embora às vezes eu me detenha contemplativo, como quem olha o vazio por tempo demais, não há tristeza ali, coisa que nos últimos dois meses - apesar do tumulto que tem atingido minha vida em Mach 5.8 - eu não tenho sentido. Mas às vezes vejo às minhas costas as lembranças de dias passados, e destes dias, eu conservo bem a memória. Pois de tudo que eles me deram, é o que eu fiz deles, e é o que sou.

E uma boa parte do que conservo destes dias, destes inomináveis e inolvidáveis dias, o que me restam, além das lembranças, sejam elas quais forem, são minhas amizades, e não posso associar outra coisa a elas que não seja boa.

Como meus amigos da "velha guarda - Neni, André, Wagner (nem sempre um favorito de todos, ou aliás, não creio que eu deveria usar a palavra favorito aqui, mas dane-se, amizades não estão sujeitas a esse tipo de avaliação - a gente não gosta dos amigos porque são perfeitos: gosta-se porque são amigos e pronto) e Betho-san. Misael, também, entre o velhos (e sem piadas aqui, já houve mais do que o bastante, e eu temo que talvez um dia as tenhamos esgotado).

E tudo isso começa em um pátio da ETFRN.

É um pouco como se a velha escola fosse um magneto que atraiu não a nós, mas uns aos outros - se é que estou sendo claro. Muitas das caras amizades que mantenho começaram, direta, ou indiretamente, a partir dali: Wagner (nosso saudoso amigo nas terras austrálicas), Henrique, Mallen, Yuri, Pinto (Ricardo e Henrique) e Cláudio (que parte para as terras do Norte). E curioso como dentro dos muros da mesma escola vieram os laços com amigos como os Vandersteens, que apesar de milhas de asfalto, cidades e linhas telefônicas, continuam a nos aparecer, como que lembrando que a distãncia não é um muro.

É curioso lembrar como esses amigos se interligam em uma teia de conexões que nunca entendi bem, como alguns deles se tornaram companheiros de trabalho, amigos, irmãos e amantes uns dos outros.

De que maneira alguém iria imaginar a priminha do Wagner tornando-se a bem-querida do Dudu? Ou Eduardo e Misael trabalhando juntos (e por duas ocasiões!), ou mesmo o nosso saudoso e lembrado (embora eu tenha soado mais funesto que gostaria neste "saudoso") Cláudio trazendo Pablo, que seria outra adição ao nosso círculo já tão complexo de amizades? Não vou nem falar da minha querida cara-metade, cuja amizade de longos anos com a esposa de Misael a trouxe para perto de mim.

E as pessoas não param de me surpreender - ora, que diabos, eu mesmo não paro de me surpreender, passando por sobre minhas próprias incapacidades e pequenos desastres recentes, dando a volta por cima e sacudindo a poeira.

Há coisas em minha vida que não gosto - algumas eu mudo, outras eu aceito, com a sabedoria que a experiência e a paciência vão me emprestando, ao longo de cada minuto, de cada dia e de cada ano. Mas se há algo que recebo, sem mudar ou ter que usar o sacrossanto sacrifício de aceitar, são minhas amizades.

E, meninos e meninas, nas minhas horas mais difíceis, quando o mundo me quer de joelhos à sua frente, eu o faço com um secreto sorriso nos lábios. Porquê todos os problemas, todas as incongruências, tudo o que me afronta empalidece quando confrontado com a inegável alegria de encontrar meus amigos, mesmo aqueles separados pelos anos ou pela distãncia, que eu sei, não são grilhões nem muros entre nós.

O mundo nunca deixa de me surpreender.