20.4.04

Gangues de Nova Iorque

Eu tenho uma mania de assistir filme velho.

E por "velho", eu quero dizer aqueles filmes que todo mundo já assistiu já faz o quê - dois anos? - Minha nossa senhora do livramento, Petras, COMO você ainda não assistiu esse filme?

Até os cinemas começarem a fazer sessões de graça, enquanto eu estiver desempregado, ou sessões em horários aceitáveis para seres humanos, quando eu estiver empregado, vai ser assim.

Alguém já viu?

Embora comece meio morno, meio clichezão, com o filho tendo que vingar a morte do pai quinze anos depois, e acabe meio que se afeiçoando pelo assassino (que lhe é como um pai), do meio pro final a coisa muda de figura. Vira uma coisa de contexto social, histórico e político, onde o que mais me saltou aos olhos foi a constatação, pela ótica dos próprios americanos, que eles são uma das raças mais xenófobas do planeta. Não perdem pros árabes, pros ingleses, e muito menos pros japonenses.

O interessante é o quarto final do filme, uma batalha campal de confronto urbano, onde o exército marcha sem muito alarde sobre ruas cobertas com os cadáveres da pobreza, literalmente até a canela em sangue da ralé. Todo o conflito se concentra mais nos bolsões de pobreza, de absoluta marginália e excllusão. Embarcações de guerra disparam contra a população amotinada no clímax que deveria ser aterrorizante, mas que não chega nem perto de um sábado à noite na Rocinha.

E foi isso que me deixou mais - sei lá, acho que mais desgostoso, mais incomodado, com aquela proverbial pulga atrás da orelha.

A coisa toda é igualzinha à situação da miséria em nossas terras tupiniquins. A polícia afogada na mais profunda e irreversível corrupção, a massa abrutalhada da miséria sendo comandada por alguns poucos iludidos que crêem ter alguma soberania porque têm poderes de vida e morte sobre meio milhar de miseráveis, ladrões e mendigos e uma pequena e soberba elite olhando a coisa toda como uma atração turística interessante e perigosa - à maneira de um safári na África.

Eu costumo lembrar muito dos posts desesperados da Denise sobre a situação do mundo - sobre a estranha condição de violência e miséria que assola nossa espécie - e penso como ela é sensível demais, como ela se deixa abater pelo "prato do dia" da mídia, tentando distrair a atenção para a verdadeira imundície lá na cozinha da realidade.

Mas não posso deixar de me sentir um pouco como ela, às vezes. Tem uma frase do filme, dita por um político, e apesar de sua origem, tão verdadeira quanto os caminhos que fazemos nesta vida: "aqui, paga-se metade dos miseráveis para que matem a outra metade".

Ah, Brasil, não mostra tua cara, ainda não. deixa eu pelo menos terminar de comer, senão volta tudo.

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